domingo, 13 de abril de 2008

Pitty


Desde a infância em Porto Seguro, ela tem seus ouvidos atentos àquela música de potencial subversivo e transformador. Começou com uma fita do conterrâneo Raul Seixas que o pai, músico, tocava no seu bar. Passou pelos Beatles e Elvis, ouvidos em casa pela mãe. E chegou aos decibéis de Faith No More, Nirvana e Metallica, contrabandeados com algum inevitável atraso para Porto Seguro por amigos, justo quando ela entrava na adolescência – fase crítica e decisiva, em que começava a alçar vôo na vida. Pitty se lembra bem: "aquela música casou com o meu estilo de espírito na época. Eu estudava em escola particular e não tinha luxo em casa, via as meninas com roupas de grife e não entendia como a imagem poderia ser algo tão importante, isso me levou a me questionar e me convencer de que o melhor era ser eu mesma". Depois de um tempo, a convicção começava a crescer cada vez mais. "Ninguém merece ser só mais um bonitinho", canta Pitty em "Máscara", uma das faixas mais pesadas do disco, digna de um álbum do Helmet.Uma estrela teen, mas com tatuagens, piercings e vestidos pretos que dariam muito assunto num papo com Phil Anselmo (Pantera), a cantora se sustenta no cenário com som, atitude e discurso. Pitty foi o apelido que a menina Priscila ganhou por causa da estatura, disposta a mostrar que o tabuleiro da baiana tem muito mais coisas do que a nossa vã imaginação poderia sacar. Na adolescência em Salvador, a espevitada cantora integrou a banda de hardcore Inkoma, que lançou fita demo, participou de coletâneas e lançou no ano de 2000 o CD Influir. "E o que impressionava não era o fato de eu ser menina, mas o nosso som, que era muito tosco. rolavam algumas piadinhas", diz Pitty, que se beneficiou de uma cena roqueira que na época abria brechas no sufoco axé de Salvador, de bandas como Lisergia, Dois Sapos e Meio, etc. As letras vieram dos diários que mantinha desde a infância – com eles, por sinal, que ela começou a se alfabetizar. Sem a menor das expectativas, numa tarde vazia, Pitty recebeu um telefone do produtor Rafael Ramos (de discos de Los Hermanos, Raimundos, João Donato, Video Hits, entre outros), que era um dos sócios do Tamborete, selo que lançara o disco do Inkoma. Informado de que ela compunha para um possível trabalho solo, Rafael pediu uma fita com as músicas em voz e violão. E o resto...o resto ainda há de ser história. Para gravar Admirável Chip Novo no Rio, nos estúdios Tambor, sob o comando de Rafael, Pitty carregou dois dos melhores músicos de rock de Salvador: o guitarrista Peu (do Dois Sapos e Meio) e o baterista Duda (do Lisergia), que tiveram até um grupo juntos, o Diga Aí Chefe. Com punch e categoria instrumental, eles ajudaram a cantora a moldar aquilo que define como 'um apanhado sonoro' de tudo que ouviu na vida. "Teto De Vidro" ('Quem não tem teto de vidro que atire a primeira pedra') abre o disco com pulsação metal, indignação punk e uma feminilidade que irá surpreender muita gente. Sem refresco, entra em seguida a também pesada faixa-título que Pitty não esconde, é mesmo inspirada pelo livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, um dos escritores favoritos dessa rata de sebo fissurada por ficcção científica. Mais uma vez, surpresa: diferentemente de um exemplar comum desse gênero popularizado por Kiss, Scorpions e Bon Jovi, o romantismo não é sinônimo de baba. Ao contrário: o componente mais forte da música é o erótico, expresso em delicadas metáforas. 'Não fiz uma música sobre amor, mas sobre sexo', entrega Pitty. Algo que certamente Avril Lavigne não escreveria por conhecer ainda pouco da vida, e Alanis Morissette por estar mais preocupada em ser zen. Mas Pitty, como de costume, não está nem aí para as comparações e nem pensa muito no futuro, bem ao estilo Kurt Cobain – o que importa é que o trabalho está feito. "Tudo pode mudar. Eu pulei do penhasco e não sei se o pára-quedas vai abrir. Mas se não abrir, também, tudo bem", diz.

(fonte: Pitty.com.br)

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